Os Reinos Espirituais

Encontramos nas Escrituras várias referências a lugares que não podemos ver. Estes lugares existem no plano espiritual, sendo que nem ao menos podemos saber onde eles estão localizados – se no centro da terra ou no espaço, por exemplo. O fato é que esses locais existem, e encontramos provas disso por toda a Bíblia. Descreveremos aqui o que nos diz a Palavra de Deus a respeito do Paraíso, do Sheol ou Hades, do Abismo, do Tártaro e do Lago de Fogo.

O Paraíso/Céu

Para muitos, o Paraíso é apenas um conceito, uma mitologia que expressa o desejo que o homem tem de sair deste mundo mau e estar em um mundo perfeito e cheio de coisas boas. Entretanto, temos algumas fortes referências bíblicas de sua existência. Tenha em mente que o Paraíso e o Céu são o mesmo lugar.

Antes de tudo, Paulo nos dá uma pista de sua convicção em relação ao mundo espiritual. Não chega a ser uma doutrina estabelecida, mas a recebemos como um fato. Em sua segunda epístola dirigida aos Coríntios, no capítulo 12, ele fala assim:

“Conheço um homem em Cristo que há catorze anos (se no corpo, não sei, se fora do corpo, não sei; Deus o sabe) foi arrebatado ao terceiro céu. E sei que o tal homem (…) foi arrebatado ao paraíso;” (2Co 12:2-4)

O apóstolo confirma duas coisas: que existem três céus, e que o terceiro deles é o Paraíso, ou seja, onde Deus está. Creio que quando Paulo fala do primeiro céu, se referia a este que vemos ao olharmos para cima; é o céu atmosférico. O segundo céu seria o espaço sideral, o cosmos que está além de nossa atmosfera. Muitos acreditam que, assim como o homem dominou a terra, satanás domina o cosmos, e não me parece algo difícil de acreditar, ainda mais quando vemos tantos cultos esotéricos falando em “contato com os seres cósmicos”, que bem sabemos serem espíritos imundos.

Paulo então, ao ser arrebatado, transpôs o primeiro e segundo céus, ambos visíveis, e adentrou ao terceiro céu, invisível; o Paraíso. Diante do que ele insinua ter ouvido e visto lá, só se pode crer que ele esteve na habitação de Deus, aquele lugar a que chamamos Céu. A teologia católico-romana desenvolveu uma idéia de que existem sete céus, sendo que Deus estaria no último. Porém, este não é o ensino bíblico. Só há três céus, sendo o último o Céu invisível.

Jesus também já havia citado o Paraíso, sendo que a própria cultura religiosa judaica de sua época já vinha fazendo referências a um lugar semelhante. Jesus disse ao ladrão que creu que ele era o Messias: “hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23:43). A súplica do homem foi: “Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no teu reino.” (v.42). Logo, podemos supor que a resposta de Jesus implica em afirmar que o Reino de Cristo é o Paraíso. E mais ainda, podemos crer que todo aquele que confessa Jesus como Senhor de sua vida entrará no Paraíso assim que partir deste mundo.

Uma outra referência ao Paraíso estáem Apocalipse. OEspíritode Cristo afirma que a árvore da vida está no meio do paraíso de Deus (vd Ap 2:7) e, mais adiante, no fim do mesmo livro, João tem uma visão da Nova Jerusalém, a “Cidade de Deus”, e assim a descreve:

“No meio da sua praça, e de um e de outro lado do rio, estava a árvore da vida, que produz doze frutos, dando seu fruto de mês em mês; e as folhas da árvore são para a saúde das nações.” (Ap 22:2)

Portanto, podemos afirmar que o Paraíso e a Nova Jerusalém são o mesmo lugar. E, em conjunto com o que vimos anteriormente, que o Paraíso é o terceiro céu, o Reino de Deus. Não existe um lugar chamado Paraíso e um outro lugar chamado Céu. Ambos são o mesmo lugar, e Deus está lá agora.

O Sheol/Hades

Nossas traduções do Antigo e Novo Testamento pecam algumas vezes. Isto é normal, pois é impossível haver uma tradução perfeita, ainda mais quando as línguas originais são tão complexas quanto o grego e o hebraico. Um desses pecados é a má tradução de duas palavras, uma hebraica e outra grega, e que significam a mesma coisa.

Tanto a palavra hebraica Sheol quanto a grega Hades indicam o local para onde vão os mortos. Na maioria das versões baseadas na tradução de Almeida, Sheol é traduzida como “morte”, “sepultura”, “abismo” ou “inferno”. Porém, o conceito por trás da palavra nem sempre admite algumas destas traduções. No Antigo Testamento, numa época em que o Cordeiro de Deus ainda não havia vindo para expiar completamente os pecados, a realidade da salvação era um pouco diferente. Não é hora de entrarmos nesses detalhes agora, mas basta-nos saber que tanto os justos quanto os ímpios iam para o mesmo lugar: o Sheol. Esta é a principal razão pela qual não é correto traduzir esta palavra como “inferno”, pois o Sheol ainda não é “o lago de fogo que arde com enxofre”.

Provas do destino comum de salvos e condenados podem ser expressas nas seguintes passagens:

Números 16:33 – Os pecadores foram tragados pelas areias do deserto e desceram vivos ao Sheol (traduzido como “abismo”);

Salmo 9:17 – O salmista afirma que os perversos serão lançados no Sheol (traduzido como “inferno”);

Salmo 16:10 – O salmista afirma que Deus não abandonará seus santos no Sheol (traduzido como “morte”)

Salmo 49:15 – Mais uma vez o salmista afirma, profetizando sobre a ressurreição do Messias, que Deus remiria sua alma do poder do Sheol (traduzido “morte”).

Como o Novo Testamento foi escrito em grego, a palavra Sheol não aparece, mas sim a equivalente grega Hades. Prova disso está na citação do mesmo Salmo 16 em Atos 2:27, que usa a palavra Hades onde, no hebraico, originalmente consta Sheol.

De acordo com a concepção mitológica grega, Hades era a divindade que presidia o mundo subterrâneo dos mortos. Mais tarde, quando os romanos adaptaram a mitologia grega à sua própria, Hades foi identificado tanto com Plutão, o deus das coisas subterrâneas, quanto com Orcus, o deus do mundo dos mortos. Eventualmente, tanto Hades quanto Orcus tornaram-se os nomes das próprias habitações desses deuses. Por uma questão cultural, já que o helenismo predominava no mundo civilizado desde o século IV a.C., o termo hebraico sheol já havia sido utilizado pelos tradutores que produziram a versão grega do Antigo Testamento em substituição de hades, sendo que eles poderiam, simplesmente, transliterar a palavra, mas não o fizeram.

Na teologia hebraica, tanto os bons como os maus iam para o mesmo lugar, sendo que lá – no sheol/hades – havia a ala dos fiéis – o “seio de Abraão” – e a dos infiéis, onde havia tormento. Tendo este background cultural e lingüístico, os escritores do Novo Testamento fizeram uso das mesmas expressões, ainda mais que queriam ser bem entendidos pelos seus leitores.

Entretanto, um grande diferencial na teologia da Nova Aliança reside na morte e ressurreição de Jesus Cristo. A Escritura é clara ao afirmar que Cristo, ao morrer, desceu ao Hades e de lá resgatou os santos da Antiga Aliança:

“Tu subiste ao alto, levaste cativo o cativeiro, recebeste dádivas de homens, mesmo os rebeldes, para que Jeová Deus habite (entre eles).” (Sl 68:18)

“Ora, isto – subiste – que é, senão que também antes tinha descido às partes mais baixas da terra?” (Ef 4:9)

Estas passagens, aliadas à esperança davídica descrita no já citado Salmo 16, nos leva a crer no seguinte quadro:

  • Na Antiga Aliança, o destino de todos os mortos era o Sheol, ainda que lá existisse um lugar – chamado por Jesus de “seio de Abraão” – para os justos e um lugar de angústia para os ímpios.
  • Quando Jesus expiou os pecados, ao morrer, desceu ao Sheol e, vencendo a morte, transportou o “seio de Abraão” para o Paraíso (as “dádivas de homens” ou, conforme outra tradução, “homens como dádivas”).
  • A partir de então, todos os santos – a exemplo do ladrão na cruz – não mais vão para o Sheol ao morrerem, mas têm condições de irem para o Paraíso.

Podemos dizer que Jesus, literalmente, abriu as portas do Paraíso para todos, ainda que apenas os que são justificados pelo seu sangue possam entrar lá. A princípio pode parecer estranho pensar que os ímpios estão no Hades (ou Sheol) aguardando julgamento, enquanto que os justos já desfrutem das delícias do Paraíso. É preciso atentar, porém, para uma verdade também muita clara nas Escrituras: não há mais condenação para os que estão em Cristo! (vd Rm 8:1). Em contrapartida, nenhum ímpio pode ser lançado no inferno, o lago de fogo, antes que seja instituído o juízo do Grande Trono Branco que antecede a eternidade. Então, é necessário que os incrédulos aguardem seu julgamento no Hades, apesar de já estarem sofrendo por seus pecados (vd Lc 16:24, note que o termo “inferno”, no original é “hades”).

Algo que também precisa ficar claro é que a herança dos santos não é o Céu, mas os Novos Céus e Terra descritos no Apocalipse. No momento, todos os santos já estão na presença de Deus, aguardando o momento de terem suas obras julgadas para receberem suas recompensas. Entretanto, isso só acontecerá quando toda a congregação dos justos for reunida no Céu, após a ressurreição, o arrebatamento e o martírio dos santos da tribulação Para mais detalhes sobre estes assuntos, consulte os capítulos 2, 3 e 7).

O Tártaro e o Abismo

Antes de entrarmos nos pormenores sobre estes lugares, devemos confirmar se realmente são o mesmo lugar. Na única vez em que lhe é feita referência, a maioria das Bíblias em português traduz tartaroô como “inferno”. Já para “abismo”, no Novo Testamento, existem pelo menos duas expressões gregas: abussos e chasma, sendo que o sentido desta última é o de uma fenda, enquanto que abussos tem ligação com um poço sem fundo da mitologia greco-romana. Algumas referências bíblicas a estas expressões são:

“E rogavam-lhe que não os mandasse para o abismo (abussos).” (Lc 8:31)

“E tinham sobre si rei, o anjo do abismo (abussos); em hebreu era o seu nome Abadom, e em grego Apoliom.” (Ap 9:11)

“Porque, se Deus não perdoou aos anjos que pecaram, mas, havendo-os lançado no tártaro, os entregou às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo (…)” (2Pe 2:4)

Assim como Hades, o Abismo e o Tártaro são expressões gregas provenientes da mitologia greco-romana. Não devemos nos espantar de os escritores do Novo Testamento – e o próprio Senhor Jesus – fazerem uso de expressões e, mais do que isso, idéias mitológicas. A cultura helênica havia se tornado dominante em todos os confins do Império Romano e, uma vez que Paulo, Pedro e outros apóstolos desejavam expandir a mensagem e a doutrina cristã por todo o Império, deveriam mesmo fazer uso daquelas idéias que eram comuns entre os gregos. Aliás, não apenas aos gregos, mas também aos judeus, que tinham conhecimento dos conceitos por trás das palavras usadas e, de fato, às vezes as usavam em sua literatura apocalíptica. A própria Septuaginta, tradução grega do Antigo Testamento feita por rabinos, séculos antes de Cristo, já havia utilizado “Hades” para traduzir “Sheol”. Então, já que o Abismo e o Tártaro provêm da mitologia, devemos ter uma compreensão aprofundada de seu significado recorrendo à própria mitologia.

O Tártaro, segundo se cria, era uma ala do Hades, sendo que este, conforme vimos, era o lugar comum de todos os mortos. Em algumas versões do mito, sobretudo na sua versão romana, o Tártaro era apenas um sinônimo para o Hades, destacando o lado punitivo da pós-morte. Porém, a mitologia original, a grega, descreve o Tártaro como um poço profundo dentro do Hades, cheio de grutas e cavernas imersas em trevas, onde os Titãs e outros deuses inferiores eram aprisionados. Este é um detalhe importante, pois quando Pedro faz menção do Tártaro em sua epístola, ele o associa exatamente à prisão de anjos que pecaram no princípio dos tempos. Com toda certeza, naquela passagem, Pedro tinha em mente um local de condenação específico para os anjos caídos.

Já o conceito que podemos desenvolver do Abismo, ao contrário do Tártato, provém inteiramente do Novo Testamento. Nas Escrituras do Antigo Testamento, o “abismo” nada mais é do que uma fonte submarina profunda ou, às vezes, um sinônimo para “Sheol”. Entretanto, nos escritos do Novo Testamento encontramos outras indicações quanto à sua natureza.

Inicialmente encontramos Jesus expulsando uma legião de demônios (uma legião militar romana era composta, em média, por cinco mil soldados) de um homem geraseno, a qual lhe implorou que não os mandasse para o abismo (Lc 8:31). Posteriormente, João descreve a visão que tem de um anjo caído chamado “Destruidor” – em hebraico Abadom, em grego Apoliom – a quem é dada a chave do abismo e que, de lá, liberta um enxame de terríveis demônios que estavam aprisionados até então. Tanto uma quanto outra passagem nos informa, implicitamente, a mesma coisa: existe um lugar onde espíritos malignos são aprisionados. Se assim não fosse, os demônios do gadareno não suplicariam misericórdia para não serem enviados para lá. O que não sabemos com certeza é se os demônios lançados no abismo podem retornar de lá após certo período, ou se precisam aguardar para serem soltos no fim dos tempos. Além disso, não temos certeza da procedência daqueles demônios que o Apocalipse nos garante que serão libertados mais adiante. Quanto a isso, só podemos especular à luz de um livro pseudo-epígrafo chamado “O Livro de Enoque”.

O fato de ser rotulado como um pseudo-epígrafo significa que não foi Enoque quem escreveu esse livro, mas que um autor desconhecido o fez e atribuiu seu conteúdo a Enoque. Entretanto, não está claro para os estudiosos se as revelações contidas no livro são fruto de pura ficção, codificação de uma tradição oral antiga ou, quem sabe, uma tradição especificamente atribuída ao Enoque que “andou com Deus”. Fato é que o Livro de Enoque propõe algumas interpretações no mínimo interessantes para alguns fatos apenas rabiscados pelo Gênesis.

Não vamos nos deter no conteúdo do livro. Basta-nos observar que lá se encontra a história dos “filhos de Deus” que se uniram às “filhas dos homens” mencionada em Gênesis 6. Segundo o escritor de Enoque, alguns anjos poderosos, detentores de segredos vedados aos homens, decidiram descer à terra e criar uma linhagem própria com as mulheres humanas. Dessa união antinatural nasceram os “nefilins”, que foram os gigantes guerreiros do passado – e que provavelmente deram origem os deuses antropomórficos que surgiriam em seguida – além de toda a propagação da violência e do ocultismo entre os homens. Segundo Enoque, esta foi a razão do dilúvio.

Logo em seguida, o autor descreve como aqueles anjos, “que não guardaram o seu principado, mas deixaram a sua própria habitação” (Jd 6) foram julgados por Deus e aprisionados em um poço no Hades, aguardando o dia do Juízo Final. A palavra “Abismo” não é utilizada, mas com certeza o conceito está aí. Inclusive, a citação acima do livro de Judas é intencional, pois já que ele mesmo cita o Livro de Enoque em sua epístola, não é difícil crer que tinha também esta história em mente quando escreveu a passagem citada.

Temos então que, à luz dos conceitos e das passagens bíblicas apresentadas, é muito provável que exista um lugar, possivelmente um compartimento dentro do próprio Hades, chamado Tártaro ou Abismo, para onde os demônios podem ser expulsos (talvez aqui resida um grande segredo de batalha espiritual) e onde estão aprisionados alguns outros terríveis anjos caídos aguardando dia e hora exatos para serem soltos.

A Geena/o Lago de Fogo

A palavra Geenna e a expressão “Geenna de fogo” foi bastante utilizada por Jesus em seus discursos. São mais de dez citações nos Evangelhos. Mas não foi o Senhor quem cunhou a palavra ou mesmo o conceito por trás dela. Já os judeus do período pós-exílico se utilizavam da palavra, que surgiu de um lugar real e de um fato histórico.

Durante o período dos reis, os israelitas se deixaram contaminar por muitos cultos idólatras importados de seus vizinhos. Ironicamente, ao que tudo indica, o culto ao infame deus Moloque foi introduzido pelo sábio rei Salomão para agradar sua esposa amonita (vd 1Rs 11:7). Moloque era uma divindade que possuía em seu interior um forno acesso, onde bebês eram lançados como oferenda. Este culto horrendo foi estabelecido em Tofete, o vale que fica na parte sul de Jerusalém, também conhecido como “o vale do(s) filho(s) de Hinom” (vd 2Rs 23:10 e Jr 32:35). Em hebraico esta expressão se escreve “Gêy Ben-Hinom”, que transliterado para o grego tornou-se “Gehenna”.

Depois que o rei Josias profanou o vale de Tofete queimando os ossos dos sacerdotes nos santuários de Moloque, o local tornou-se um depósito de lixo para a cidade de Jerusalém. Dizem que neste local passou a arder um fogo que era mantido sempre acesso para queimar o lixo, além de carcaças de animais e ossos humanos. Foi exatamente deste “fogo inextinguível” que os fariseus e a tradição rabínica criaram o conceito da Geena. No Hades, que era o local para onde todos os mortos iam, havia o Seio de Abraão, onde os justos aguardavam a ressurreição e a Geena, onde os ímpios, já sofrendo, aguardavam o Juízo Final. A parábola do Rico e Lázaro ilustra perfeitamente a visão judaica de então referente à pós-morte.

Apesar de tomar emprestado o conceito de Geena do judaísmo, o ensinamento de Jesus concernente ao castigo dos ímpios acrescentou um detalhe: a condenação na Geena de fogo era eterna! Ainda que alguns grupos como os Testemunhas de Jeová e os Adventistas – além dos próprios Judeus – não aceitem uma condenação eterna no inferno, algumas passagens do ensino de Cristo parecem indicar isso:

“E, se tua mão te faz tropeçar, corta-a; pois é melhor entrares maneta na vida do que, tendo as duas mãos, ires para o inferno, para o fogo inextinguível(Mc 9:43)

“Então, o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos.” (Mt 25:41)

“E irão estes para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna.” (Mt 25:46)

A idéia de uma condenação eterna num lago de fogo e enxofre pode mesmo chocar, porém não é nosso propósito discutir aqui se a condenação será para sempre ou se um dia os ímpios serão aniquilados. O fato incontestável é que as Escrituras afirmam existir um lugar de condenação para onde serão enviados todos os ímpios e incrédulos. Jesus chamava este lugar de Geena, enquanto o Apocalipse o chama de “lago de fogo que arde com enxofre” (Ap 19:20), ao qual atribui o título de “a segunda morte” (Ap 21:8). Para estas expressões e conceitos cabe aqui propriamente a tradução portuguesa “inferno”.

Talvez o conhecimento mais importante que devemos ter do inferno é que: (a) ele não foi criado para o homem; e (b) ele ainda não foi inaugurado. Jesus afirma claramente o propósito da criação do lago de fogo em um de seus discursos:

“Então, o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos.” (Mt 25:41)

Tal verdade, a de que o inferno foi criado para os anjos caídos, é um tanto óbvia, pois o pecado nasceu justamente da rebelião do querubim da guarda e dos anjos que o seguiram. Entretanto, uma vez que o homem vem aderindo à rebelião dele desde o princípio, a condenação ao inferno se estendeu também à humanidade ímpia. De certo modo isso nos explica o porquê de Deus condenar suas criaturas, criadas à sua imagem e semelhança, a um destino tão horrendo.

Quanto à atual situação do inferno, muitas vezes ouvimos pregadores e crentes dizerem coisas do tipo: “as forças do inferno se levantaram”, “satanás, de seu trono no inferno…” ou “as portas do inferno não prevalecerão contra a igreja”. À luz da revelação bíblica estão são afirmações erradas. Infelizmente, por causa de nossa incontestável herança católico-romana, muitos acreditam que o “reino de satanás” é o inferno. De fato, esta imagem vem sendo perpetuada por bandas de rock pseudo-satanistas e supostos adoradores do diabo. O inferno não é o reino de satanás, nem o seu trono está lá. Ao contrário, ele e seus demônios estremecem pela simples menção da palavra “inferno”, pois ele sabe que em breve será lançado lá para sofrer sua condenação eterna! (vd Ap 20:10).

De acordo com o Apocalipse, os primeiros seres a inaugurarem o lago de fogo serão o anticristo e o falso profeta (vd Ap 19:20). Nem mesmo os anjos caídos serão lançados lá antes do Juízo Final! Com isso percebemos que o inferno hoje ainda está desabitado; não há ninguém lá ainda, apesar de que todos os que morreram sem terem seus pecados expiados já estão invariavelmente condenados ao mesmo. A Bíblia não abre espaço para a crença em um purgatório, assim como crêem católicos e a maioria das correntes judaicas.

A realidade futura

De acordo com o que as Escrituras nos revelam, hoje existem quatro lugares espirituais:

  • o Paraíso ou Céu, onde Jesus está entronizado à destra de Deus Pai e para onde vão os espíritos dos santos mortos;
  • o Hades, para onde vão os ímpios aguardar, já em tormento, o Juízo de suas obras;
  • o Abismo ou Tártaro, onde estão aprisionados alguns anjos que caíram no princípio dos tempos e, supostamente, para onde podem ser expulsos os que atuam em nossa esfera de existência (pode ou não ser um lugar dentro do próprio Hades;
  • o inferno (ou Geena, ou lago de fogo), para onde, segundo o Apocalipse, serão lançados satanás, seus anjos e todos os ímpios que seguiram o seu exemplo.

Por sinal, a tradução correta de Apocalipse 20:14 diz tudo a esse respeito:

“E a morte e o Hades foram lançados no lago de fogo. Esta é a segunda morte.”

Quando, porém, acontecer o Julgamento do Grande Trono Branco e, definitivamente esse fato acontecer, tudo mudará. Não apenas haverá novos céus e terra, mas também a própria realidade dos mundos espiritual e físico passará por uma mudança radical. Quando o Hades for lançado no lago de fogo, já não haverá mais distinção entre Hades, Abismo e inferno. Além disso, segundo a revelação do Apocalipse, o Céu e o universo hoje existente serão um só (cf Ap 21:1-3). Assim, na eternidade, haverá apenas o Novo Céu-Terra – onde estarão Deus, Jesus, os anjos e todos os santos – e o lago de fogo – moradia perpétua do diabo, dos anjos caídos e de todos os ímpios “cujos nomes não foram inscritos no Livro da Vida”.